Linde, Estudos Avançados. Vol. 24, n. 70, p. 31-69, 2010
"Começara uma nova era. a era da terapia gênica (ou terapia genética), ou seja, o procedimento destinado a introduzir em um organismo, com o uso de técnicas de DNA recombinante, genes sadios (nesse contexto denominado “genes terapêuticos”) para substituir, manipular ou suplementar genes inativos ou disfuncionais (Linden, 2008).” (p.31)
"entretanto, foi só no início da década seguinte que Paul Berg conseguiu de fato manipular uma molécula de DNA (Jackson et al., 1972), criando a tecnologia do DNA recombinante.” (p.32)
“a idéia de usar as técnicas de DNA recombinante para corrigir o genoma foi inspirada nas doenças causadas por mutação em um único gene (ditas doenças monogênicas). nesse caso, a idéia é substituir ou suplementar a expressão do gene disfuncional, mediante a inserção de uma ou mais cópias do gene terapêutico (Porteus et al., 2006; o’Connor & Crystal, 2006; Brinkman et al., 2006). o tratamento da sCId-ada representa uma aplicação bem-sucedida dessa idéia.” (p.33)
“Mas as doenças monogênicas não são o único alvo da terapia gênica (Figura 1). a medicina moderna luta contra muitas doenças complexas, cujas causas primárias ainda não são conhecidas e para as quais há, na melhor das hipóteses, apenas tratamentos paliativos. em certos casos, é possível planejar uma intervenção por meio de terapia gênica, visando reduzir ou evitar a progressão da doença. a intervenção pode ser baseada no conhecimento de determinantes genéticos de suscetibilidade ou gravidade, ou na oportunidade de alterar mecanismos fundamentais ou a fisiologia das células, dos órgãos ou sistemas afeta-34 estudos avançados 24 (70), 2010 dos pelas doenças (Cardone, 2007; Flotte, 2007)” (p.33 e 34.)
“Já as terapias gênicas são baseadas na introdução ou modificação de genes. Isso pode ser feito diretamente in vivo, sem o auxílio de células inteiras do próprio paciente ou de doadores.” (p.34)
“Como em outras áreas de investigação de novos métodos terapêuticos, a aprovação de um produto ou processo de terapia gênica depende da realização de uma série de ensaios clínicos, que são classificados por fases. Inicia-se pela chamada fase I, cujo objetivo é testar a segurança do procedimento e identificar quaisquer efeitos adversos atribuídos ao novo produto ou método. seguem-se ensaios de fase II, III e Iv que, progressivamente e sempre acompanhados de vigilância quanto a efeitos adversos, destinam-se a testar a eficácia do novo produto ou método em amostras crescentes de pacientes, freqüentemente distribuídos em múltiplos centros de pesquisa” (p.40)
“a segurança ainda é a principal barreira ao desenvolvimento da terapia gênica para a prática médica. o principal entrave é o fato de que os vetores não virais mais seguros disponíveis no momento são ainda pouco eficientes ou têm aplicação muito limitada, como é o caso dos plasmídeos discutidos antes. a alta eficiência de transdução de vetores virais torna estes últimos os mais promissores para aplicação. entretanto, alguns tipos, particularmente de vetores adenovirais e retrovirais, os mais utilizados até hoje, produziram efeitos adversos, alguns graves e mesmo fatais, e contribuíram fortemente para o bloqueio de muitos estudos na fase I.” (p.42)
“o tópico de vetores é, sem dúvida, o mais crítico para o avanço da terapia gênica no sentido da aplicação à prática médica.” (p.45)
“Cresce, contudo, a expectativa de utilização de vetores virais intrinsecamente mais seguros, como os vetores derivados de vírus adenoassociado.” (P.45)
“a LCa é uma doença que provoca cegueira progressiva, iniciando-se com perda importante de visão em bebês e progredindo ao longo do tempo para cegueira total. Inicialmente, os fotorreceptores, células retinianas sensíveis à luz e imprescindíveis para a visão, são inativados, mas permanecem vivos na retina (den Hollander et al., 2008). Com o passar dos anos, os fotorreceptores inativos, predominantemente os bastonetes que funcionam em baixos níveis de luminosidade, degeneram e desaparecem.” (spuy et al., 2005). (p.46)
“tratamentos para os demais grupos de pacientes terão de ser desenvolvidos caso a caso. ainda assim, trata-se de um avanço importante no desenvolvimento de novas terapias para doenças que levam à cegueira, e já está em andamento um ensaio clínico fase II para confirmar (ou não), de forma sistemática, a possível eficácia do tratamento.” (p.48)
“Câncer: a maioria dos ensaios clínicos de terapia gênica tem sido feita em pacientes de câncer (Figura 9), em geral em estágios avançados. o efeito desejável de qualquer tratamento para o câncer é o de provocar a morte seletiva das células tumorais (evan & Littlewood, 1998; Green & evan, 2002). Células cancerosas geralmente multiplicam-se com rapidez, o que explica o crescimento dos tumores. Muitos fármacos são usados no tratamento do câncer justamente porque atacam seletivamente células que se multiplicam com rapidez e, portanto, matam células tumorais (Wang et al., 2008; Prochownik, 2008; vazquez et al., 2008.” (p.48)
“o procedimento apelidado de “técnica de genes suicidas” consiste em introduzir nas células tumorais um gene que não existe no genoma humano e codifica a enzima timidina cinase, proveniente do genoma do herpesvírus. a presença dessa enzima em uma célula humana mata a célula na presença de uma droga chamada ganciclovir, pois a timidina cinase transforma o ganciclovir em uma toxina” (p.48)
“embora a eficácia da tecnologia de gene suicida para tratamento de tumores seja ainda controversa, alguns estudos obtiveram resultados animadores.” (p.49)
“Doença de Parkinson: as doenças neurodegenerativas são uma das classes mais problemáticas para a medicina contemporânea. apesar dos avanços ocorridos desde os anos 1990, período denominado “década do cérebro” (Goldstein, 1994), e do extenso conjunto de conhecimentos acumulados sobre diversos aspectos da patogênese, genética, curso clínico, complicações e resposta aos diversos tratamentos testados ao longo de anos de investigação, há uma conspícua carência de opções terapêuticas, particularmente nos estágios mais avançados destas doenças (Radunovic et al., 2007; Cacabelos, 2007; Han & Mcdonald, 2008; Jalbert et al., 2008; Gauthier & Poirier, 2008; olanow et al., 2008).” (P.50) “As agências reguladoras envolvidas na autorização e no controle de ensaios clínicos em terapia gênica agiram rapidamente em ambos os casos de efeitos adversos aqui relatados. em 1999, o ensaio que resultou na morte do paciente foi suspenso definitivamente, apesar da ausência de efeitos adversos graves nos outros 17 pacientes tratados no mesmo estudo. no caso dos ensaios para sCIdXL, os procedimentos terapêuticos já estavam encerrados, mas as autorizações 56 estudos avançados 24 (70), 2010para outros ensaios semelhantes foram suspensas até a avaliação criteriosa dos dados e, posteriormente, voltaram a ser concedidas. em que pese o reconhecimento de que o procedimento de terapia gênica foi responsável pelos efeitos adversos, os comitês reguladores concluíram que nenhum desses eventos, assim como outros efeitos adversos relatados ocasionalmente, justifica a abolição de ensaios clínicos em terapia gênica. na verdade, a análise dos efeitos adversos tem contribuído para orientar o desenvolvimento biotecnológico na área e, ao mesmo tempo, aperfeiçoar a regulamentação e os critérios para autorização de ensaios clínicos.” (p.55 e 56)
“o interesse do setor industrial na terapia gênica pode ser ilustrado por dados provenientes de organizações especializadas em prospecção tecnológica. análise da evolução do número de produtos destinados à terapia gênica, em fase de desenvolvimento por parte de empresas, revela um aspecto importante.” (p. 60)
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